Revista Manifesto nº 2

6.50

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Descrição

Nem sempre uma revista semestral, dedicada a questões sociais e políticas, reflete o «espírito do tempo» em que é publicada. Seja por se centrar na análise de um tema específico, não necessariamente em voga, seja por apenas dar conta de matérias de atualidade na respetiva secção. Mas o número da Manifesto que agora chega às mãos dos leitores acaba por captar, sem que o pretendesse à partida, o ambiente que se sente nesta aproximação ao novo ano de 2019.

Dois temas sobressaem nesta edição. Por um lado, o balanço prospetivo da solução política encontrada na sequência das legislativas de 2015, com a convergência inédita, na democracia portuguesa, dos partidos de esquerda. Por outro, a situação complexa e delicada que resultou das eleições no Brasil, no passado mês de outubro. De modo contraditório, e por isso de certa forma desconcertante, estas questões refletem o otimismo crítico e o pessimismo realista que se sente no ar.

Num momento em que o fim da atual legislatura se confunde já com o ciclo eleitoral que se avizinha, a identificação das prioridades que se colocam a uma eventual renovação da convergência à esquerda constitui o tema do dossiê. Os textos que o compõem procuram fazer um balanço das melhorias e avanços em diferentes áreas sociais nos últimos três anos, sinalizando as propostas em que poderá assentar a governação, no contexto da reedição dos entendimentos à esquerda. Se até aqui prevaleceu a recuperação dos danos causados pela anterior maioria, importa agora – na próxima legislatura – adotar políticas que permitam aprofundar o Estado Social.

Aliás, pretende-se até ir mais longe, fortalecendo domínios que têm sido negligenciados (como a habitação e a cultura) e setores que não têm sido encarados enquanto parte integrante das funções sociais do Estado (como os transportes, as políticas do território ou as questões do envelhecimento). Sem deixar de equacionar políticas que permitam aprofundar as áreas mais consolidadas do Estado de bem-estar (como a saúde ou a educação).

O enquadramento europeu e orçamental em que este aprofundamento do Estado Social se desenvolve não pode, contudo, ser ignorado. Por isso, a discussão de matérias como o crescimento, as regras europeias ou os limites orçamentais que se colocam a uma futura governação de convergência entre as esquerdas, são igualmente consideradas neste número, mesmo que assumam hoje menor destaque no debate público.

Do Brasil chegam-nos preocupação e um profundo desconforto, que contrastam com o tal otimismo crítico e exigente perante a possibilidade de novas soluções para entendimentos à esquerda. Alinhada com a tendência de aumento

de populismos de direita e extrema-direita, no lado de lá e no lado de cá do Atlântico, a eleição de Jair Bolsonaro prenuncia tempos muito difíceis, mas também de luta e resistência.

Os dois temas que marcam esta edição da revista – o balanço prospetivo da solução política encontrada em 2015 (que deu suporte à atual legislatura) e as eleições e a situação no Brasil (cujas consequências são ainda difíceis de avaliar) – servem de mote às duas entrevistas que integram este número. A abrir o dossiê, a entrevista a Manuel Carvalho da Silva. Nas páginas que o precedem, a entrevista a Manuela d’Ávila.

Completam este número da Manifesto o debate sobre a exploração de petróleo em Portugal, numa nova secção de contraditório; os textos de Luísa Costa Gomes e Regina Guimarães na secção Estórias; o portefólio de Fernando Marante, os trabalhos de Júlio Pomar (cuja cedência agradecemos a Alexandre Pomar e ao Atelier-Museu Júlio Pomar) e de Sérgio Condeço e a evocação de Piteira Santos (com um texto de Manuel Alegre), e de Paulo Varela Gomes (com a republicação de um texto sobre carros, cidades e passeios, de 1993, cuja atualidade não passa despercebida).

Já depois de editado o primeiro número desta segunda série da Manifesto, confrontámo-nos com a perda do João Semedo (em julho) e do António Loja Neves (em maio). O João tinha-nos enviado uma mensagem de grande satisfação pelo primeiro número da revista. O António estava a preparar um texto, que não chegou a terminar, para este segundo número. É com um sentimento de perda, mas também de imensa gratidão pelo legado de firmeza e coragem na defesa das suas convicções, que os evocamos na nota de abertura desta edição da Manifesto.

O Conselho Editorial