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Resolução Política aprovada na Assembleia Geral

Fórum Manifesto – Assembleia Geral Extraordinária – 13 de setembro de 2014

  1. Ao longo dos anos, o Fórum Manifesto tem procurado ser um espaço de debate e de intervenção política de muitos que, à esquerda, procuram caminhos de transformação progressista da sociedade portuguesa – alargamento e reforço de direitos sociais e políticos; combate às várias formas de desigualdade; reforço de uma democracia participada. Sempre num espírito de diálogo e abertura, combatendo a cultura de sectarismo que tantas vezes tem dominado a esquerda. Foi com esta cultura de diálogo que, ainda com a denominação de Política XXI, protagonizou uma candidatura europeia plural aberta à participação de muitos independentes; foi nessa perspetiva que contribui para a fundação do Bloco de Esquerda; foi por isso que se bateu sempre dentro do próprio BE; e é movido por esse espírito que tem lançado pontes para novos e mais abrangentes entendimentos à esquerda. Porque na actual situação política, essa vontade de construir diálogos entre diferentes leituras e propostas é ainda mais importante. Esse caminho de abertura e convergência foi, e deve continuar a ser, o caminho do Manifesto.
  1. Portugal vive hoje um tempo político singular na sua recente história democrática. A imposição de uma lógica austeritária a nível europeu tem-se traduzido em Portugal numa política activa de destruição do Estado Social, de interrupção da vertente redistributiva das políticas públicas e de estrangulamento económico. Para a maioria dos portugueses, esta é uma nova experiência da integração europeia, que contrasta profundamente com os quase 30 anos em que as políticas europeias de liberalização vinham acompanhadas de processos de investimento, os quais permitiram a modernização em áreas fundamentais, como as infra-estruturas de transporte ou a educação. Esse tempo – em que a consolidação democrática e a integração europeia pareciam desenrolar-se em simultâneo, deixando um lastro de identidade pró-europeia em amplos segmentos da população – parece ter chegado ao fim. A partir do discurso do sobre-endividamento é agora imposta a ideia de que as políticas públicas de redução das desigualdades e de redistribuição, o investimento público de modernização e os direitos sociais estão “acima das nossas possibilidades”. Ao longo da crise tem ficado demonstrado que esta não foi causada, mas sim amenizada pela estrutura do Estado Social.
  1. Nesse sentido, está hoje em curso uma reconfiguração do regime no qual assentou a construção da democracia em Portugal. A articulação entre liberdades políticas e direitos sociais foi fundamental na legitimação e na inscrição política do regime democrático português, que se corporizou em políticas redistributivas e consagração de direitos sociais, ainda que muitas vezes incompletas ou insuficientes. Mas essa lógica de regime desenhou igualmente uma concepção de sociedade democrática que vai muito para lá do sistema de representação política. É aliás contra essa concepção de democracia alargada como sociedade vocacionada para a justiça social e dignidade dos cidadãos que a política do actual Governo tem esbarrado, nos sucessivos confrontos com a Constituição. Apesar disso, os riscos que pairam sobre o pilar da cidadania social colocam uma urgência nova na criação de resposta políticas que, no actual contexto de forças nacional e europeu, permitam defender a sustentabilidade da democracia social.
  1. Para que tal seja possível entendemos ser necessário criar um espaço político que congregue todos os que, à esquerda da alternância, estão disponíveis para contribuir para uma solução governativa assente na sustentação de uma sociedade democrática em sentido amplo. O que exige ultrapassar duas estratégias na esquerda portuguesa que consideramos politicamente inúteis: a primeira, dos que não vêem possibilidade de acção governativa no actual contexto e que se entrincheiram para resistir até um eventual momento de ruptura; a segunda, até agora prevalecente no PS, dos que entendem que qualquer confronto com a política austeritária da Europa arrisca a desvinculação e o isolamento de Portugal do espaço europeu, e que esse risco é demasiado grande para que essa batalha possa ser tentada, significando na prática que temos de esperar por um “milagre europeu”.
  1. No Manifesto, pelo contrário, pensamos que a urgência de responder ao que está em curso não pode ser menorizada. O espaço político para trilhar este caminho de construção de compromissos de governação é estreito mas existe, e tem que ser construído num diálogo programático que aceite a existência de identidades políticas múltiplas. Nesse sentido, o Manifesto tem procurado um diálogo com outros sectores sociais e actores políticos, nomeadamente com alguns dos promotores do Manifesto 3D e com o Partido Livre, que se revêem neste sentido de urgência de resposta política à situação actual, e que têm igualmente procurado estabelecer diálogos e convergências à esquerda.
  1. Por isso, acreditamos ser necessário colocar em marcha um processo mobilizador de construção programática, que conte com a participação de diferentes sectores e organizações da sociedade portuguesa, em torno de um programa de governação determinado em combater o empobrecimento e o declínio do país para garantir um futuro de dignidade e justiça, e preparado para enfrentar dificílimos desafios e constrangimentos com realismo e determinação. Desafios e constrangimentos políticos, económicos e financeiros, internos e externos, entre os quais têm especial relevância a dependência externa da economia portuguesa, o endividamento e o desfavorável quadro institucional e político da União Europeia.
  1. Este processo, em que o Manifesto se empenhará, deverá culminar na construção de uma ampla plataforma com outros actores políticos e sectores sociais, que permita apresentar aos portugueses, nas próximas eleições de 2015, uma candidatura determinada a participar numa solução de governaçãoque trave o desmantelamento do Estado Social, o desemprego, a emigração, a precarização das relações laborais, a contínua redução de salários e pensões; que impeça o empobrecimento e o progressivo despovoamento do nosso país e que se passa por uma agenda progressista e transformadora.